Diante dos retrocessos e da acelerada degradação dos direitos das mulheres, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva -Abrasco, a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) e a Rede Unida protocolaram no Supremo Tribunal Federal uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), em 29 de junho, questionando o papel sistemático que a União tem agido pelo rebaixamento ao direito do aborto legal, ou seja, nos casos garantidos por lei.
A ação foi motivada pelas leituras expressas publicamente pelo Ministério da Saúde a partir da publicação da cartilha “Atenção técnica para prevenção, avaliação e conduta nos casos de abortamento”, lançada em 15 de junho, e posteriormente repetidas em audiência pública com baixíssima representatividade das entidades da sociedade civil, realizada em 28 do mesmo mês. O documento foi duramente criticado pelo movimento sanitário e feminista por meio da Nota de repúdio ao “manual” sobre atenção ao aborto do Ministério da Saúde, liderada pela Abrasco e com assinatura de mais de 20 organizações, coletivos e movimentos feministas.
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Além de questionar as restrições impostas ao aborto garantido pelo Artigo 128, parágrafos I e II (instituído no Código Penal de 1940) pela ADPF 54, no caso de gravidez de fetos anencéfalos, de 2012, a ADPF 989 lista também todas as demais dificuldades encontradas no cotidiano de meninas e mulheres que poderiam ter o seu direito à saúde assistido pelo SUS, mas que, por falta de informação e organização do sistema de saúde, são empurradas para unidades sem preparo e/ou mesmo valendo-se de métodos inseguros, provocados por ingestão de medicamentos ou até pelo uso de objetos perfurantes, resultando um elevado número de abortos supostamente espontâneos.
“Com isso, fica à toda evidência a ausência de políticas públicas adequadas. Pior: o próprio Estado estabelece barreiras pela desinformação, pela burocracia, pela necessidade de deslocamento e custeio da logística, além da recente instrução relacionada ao tempo gestacional, de até 22 semanas, que não encontra qualquer sustentação jurídica ou na medicina baseada em evidências”, traz a peça jurídica.
Por fim, a ADPF 989 pede a declaração de inconstitucionalidade de qualquer ato dos Poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário que restrinja o acesso ao aborto legal. Solicita também que se reconheça a omissão e as barreiras que o Ministério da Saúde tem criado às mulheres e meninas que precisam realizar a interrupção da gravidez nos casos previstos em lei.
A ação já foi distribuída ao ministro Edson Fachin. “O quadro narrado pelas requerentes é bastante grave e parece apontar para um padrão de violação sistemática do direito das mulheres”, disse o ministro relator em despacho no qual solicita ao Ministério da Saúde e à Presidência da República informações sobre as providências para garantir o aborto nas hipóteses permitidas no Código Penal. A União tem o prazo de cinco dias – até sexta-feira, dia 8.