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Pesquisa inédita mostra pesticidas proibidos em alimentação infantil

Vilma Reis com informações de Mariana Alvim / O Globo

O cardápio nas escolas municipais do Rio tem arroz, feijão, couve e outros produtos nutritivos. Mas, segundo uma análise do Greenpeace Brasil, pode ter também procimidona, metamidofós e mais “ingredientes” de nomes estranhos. Em uma pesquisa inédita, a organização adquiriu 20 amostras de alimentos, ou 40kg de comida, de um fornecedor da rede de ensino carioca. Na avaliação dos produtos, foram encontrados agrotóxicos em 60% das 20 amostras. E 45% apresentaram alguma irregularidade, como a presença de um pesticida proibido no Brasil, o metamidofós, que, de acordo com o Greenpeace, foi verificado em 10% das amostras.

Dentre as amostras, 35% apresentaram agrotóxicos não permitidos para aquela cultura específica. Em 20%, havia pesticidas acima do limite permitido. E, finalmente, 35% das amostras continham resíduos de duas ou mais substâncias diferentes — o que não é proibido mas, segundo especialistas, acende o alerta para um “efeito coquetel” cujos malefícios para a saúde ainda precisam ser estudados.

Somente no pimentão amarelo, por exemplo, foram encontrados sete agrotóxicos diferentes.O Rio foi o “laboratório” escolhido porque, segundo dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) pesquisados pelo Greenpeace, a prefeitura não destinou nenhuma verba do Plano Nacional de Alimentação Escolar para agricultura familiar em 2014. Uma lei federal determina que este percentual seja de pelo menos 30%. Capitais como Porto Alegre e Belo Horizonte têm desempenho bem melhor, com percentuais, respectivamente, de 35,9% e 29,7% .

— Os resultados que encontramos foram espantosos. Não se trata de vilanizar o agricultor individual, mas de cobrar saídas do poder público. O que o levantamento revela é uma falta de controle, e as propostas que tramitam atualmente no Congresso vão potencializar esse cenário — aponta Rafael Cruz, membro da campanha de Agricultura e Alimentação do Greenpeace Brasil, se referindo a uma comissão especial na Câmara dos Deputados que discute a substituição da atual Lei dos Agrotóxicos.

Hoje, o controle dos agrotóxicos é atribuição, principalmente, do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e, com relação aos impactos ambientais do uso desses produtos, do Ministério do Meio Ambiente e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama). Um exemplo da falta de controle a que se refere Cruz é a já longínqua publicação, em 2012, da mais recente edição do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para) — publicação da Anvisa que monitora os níveis de pesticidas. Segundo a agência, o programa está sendo reformulado, sem previsão de retorno.

Para o levantamento, o Greenpeace Brasil encomendou às fornecedoras da rede municipal, em setembro, alimentos listados no cardápio escolar da capital. Apenas uma das seis empresas respondeu. Trata-se de uma firma que, segundo dados da Prefeitura do Rio, atende a duas áreas programáticas com um total de 181 escolas. Os testes foram realizados no Instituto Biológico de São Paulo.

Um dos dados mais reveladores foi a presença do metamidofós nas amostras de couve-manteiga: a substância foi proibida pela Anvisa em 2012, após sua interdição em outros países e a publicação de estudos que relacionaram o composto a malefícios ao sistema endócrino e reprodutor. Para quem trabalha com a qualidade da alimentação, a revelação não pareceu tão surpreendente.

— Não é incomum encontrar o uso de substâncias proibidas no Brasil. Esta realidade que se mostra nas escolas é a mesma nos supermercados e restaurantes do país, com cerca de um terço dos alimentos impróprios. Se os agrotóxicos têm sido associados a alterações hormonais e efeitos crônicos, nas crianças isto se agrava, porque o organismo ainda está em desenvolvimento — ressalta Karen Friedrich, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e membro da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

Segundo o Greenpeace Brasil, apenas duas capitais brasileiras têm legislação para a transição para merenda escolar orgânica: São Paulo e Porto Alegre. Para as eleições municipais deste ano, a ONG elegeu a alimentação como uma das três prioridades na pressão a candidatos, e vem buscando o compromisso deles com propostas como a garantia de comida sem agrotóxicos para os alunos.

ESTÍMULO LOCAL

O estímulo a orgânicos às vezes brota em nível local. O projeto Alimentação Escolar Saudável, presente em mais de 90 colégios públicos do Estado do Rio, gerou a inclusão de mais de 18 toneladas de produtos orgânicos no cardápio de pelo menos 30 mil alunos de cinco municípios: Três Rios, Paraíba do Sul, Itaperuna, Pinheiral e Trajano de Moraes.

Já no Colégio Estadual Professor Teófilo Moreira da Costa, no bairro de Vargem Grande, cerca de 43% das refeições são orgânicas.

— A região e a escola têm origem rural, e buscamos reforçar essas identidades. Fazemos excursões às plantações, projetos de extensão, trabalhamos com o conteúdo em aula — explica o diretor da escola, o geógrafo Carlos Motta.

Em resposta à reportagem, a Secretaria Municipal de Educação informa que a alimentação de todas as unidades escolares da rede é acompanhada pelo Instituto de Nutrição Annes Dias (Inad), responsável pela organização do cardápio escolar por meio da avaliação de especialistas em nutrição. “O Instituto também planeja e adota ações que visam estabelecer e monitorar a execução de critérios para a aquisição e o fornecimento de produtos alimentícios, além de orientar as unidades escolares quanto às boas práticas na manipulação desses alimentos, que vão desde o cuidado com uniformes e utensílios, até guias alimentares”.

Entre as principais medidas realizadas pela SME ao lado do Inad está a qualificação técnica dos fornecedores e também da análise realizada no Laboratório Dietético do próprio Instituto, para comprovar a qualidade dos produtos fornecidos, além de identificar se os padrões técnicos estão em conformidade daquilo que é exigido para a rede municipal de ensino, diz o documento.

A SME rebate ainda os dados do Greenpeace Brasil e responde que tem um Projeto em conjunto da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para fornecimento de produtos orgânicos da agricultura familiar para a rede municipal de ensino, um projeto assinado com a União das Associações e Cooperativas de Pequenos Produtores Rurais do Estado do Rio. E informa que está ampliando seu trabalho em conjunto com outros Órgãos/Instituições com o objetivo de adquirir gêneros alimentícios oriundos da Agricultura Familiar. “Especificamente no ano de 2014 foi realizada uma chamada pública para o fornecimento desses itens, porém, não houve interessados”, informa em nota.

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