Foi aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Presidente da República como Lei nº 14.648, projeto que autoriza a realização de ozonioterapia como procedimento complementar para tratamento de pessoas.
A Abrasco traz a público suas preocupações de diversas ordens, algumas delas explicitadas a seguir:
1 – Não há hoje evidências científicas consolidadas que sustentem o uso de ozônio em tratamentos. Em outras palavras, os estudos publicados que corroboram a prática são poucos e de baixa qualidade. As indicações propostas por seus defensores são amplas, incluindo, entre outras, as doenças autoimunes, problemas respiratórios, tratamento da infecção pelo HIV, tratamento de infecções, tratamento do câncer, doenças osteomusculares, complicações de diabetes (grifos nossos). Em muitos casos, são doenças graves que exigem tratamento adequado e podem ser agravados por terapêuticas inadequadas.
2 – O Congresso Nacional já aprovou anteriormente a utilização de determinados medicamentos para tratamentos de doenças, que posteriormente foi revogada, pois leis não são o mecanismo mais adequado para aprovar ou indicar tratamentos para a saúde. Medidas para diagnóstico e terapêutica, para que não causem risco às pessoas e produzam os resultados pretendidos, devem ser submetidos a pesquisas científicas e avaliados por profissionais e instituições que têm competência técnica para tanto. Não se trata de um tema que possa ser tratado no âmbito estritamente político. Além disso, produzem-se novos conhecimentos e inovações continuamente, o que motiva a constante revisão de diretrizes e procedimentos para a prática dos profissionais de saúde, o que não pode ser tratado de maneira adequada e oportuna em um instrumento como a lei, que, por sua natureza, oferece estabilidade e validade de longo prazo.
3 – Além da falta de demonstrações de que os tratamentos com ozônio são eficazes para as indicações descritas, tampouco há comprovação suficiente de que a terapia não produza efeitos adversos. As próprias formas de administração trazem riscos que não devem ser menosprezados. Algumas das vias de aplicação são: auto-hemotransfusão, injeção de ozônio por via intravenosa, por via intramuscular ou até mesmo entre os discos vertebrais, aplicação cutânea, insuflação retal através de um cateter introduzido no intestino, método que também pode ser realizado por outros orifícios como boca, nariz ou vagina, banho de gás, com uso de uma câmara cheia de gás ozônio para que haja inalação. A simples leitura desta relação demonstra que alguns dos procedimentos são invasivos e exigem habilidades que são exclusivas do profissional médico e cujo conselho não autoriza a prática.
4 – Embora a aprovação seja como terapia complementar, uma vez que não há exigência de diagnóstico ou indicação médica, há risco de que métodos reconhecidos pela ciência sejam adiados ou mesmo substituídos, levando ao agravamento de doenças ou a perda de possibilidade de tratamento oportuno.
Assim, alertamos primeiramente os parlamentares, para que recoloquem o tema em pauta, com vistas à revogação da referida Lei. Apelamos também ao Ministério Público e a Poder Judiciário, para que analisem a constitucionalidade do dispositivo, uma vez que pode haver ameaça à vida e à integridade física. Por fim, instamos os conselhos de todas as profissões da saúde para que façam orientação e fiscalização adequadas do exercício para reduzir os riscos aqui apontados. Dado o papel do profissional médico e a responsabilidade que carrega em relação a diagnóstico, indicação e administração de tratamentos, destacamos aqui a necessidade mais específica de que os conselhos de medicina ajam frente à atuação irregular de médicos que vêm oferecendo tal serviço.