Mobilizar a sociedade e pressionar o poder público para garantir o acesso universal e igualitário a todos os pacientes com casos graves da Covid-19 ao sistema de saúde com uma regulação dos leitos hospitalares que unifique a rede pública e privada como prioridade no esforço de salvar vidas durante a pandemia. Foi em torno desta pauta que as campanhas Leitos para Todos e Vidas Iguais nasceram. Diante do crescimento do número de internações, da eminente saturação na ocupação dos leitos públicos e da força que essa demanda ganhou na sociedade, as campanhas tomaram a decisão de se unificarem em torno de ações e de um manifesto conjunto.
Cenário de desigualdades: Comparar os dados sobre os leitos geridos pelas redes pública e privada mostra a grande desigualdade do acesso à saúde no Brasil. Apesar de 75% da população contar unicamente com os serviços de assistência do Sistema Único de Saúde, o SUS, a rede pública conta com somente 44% dos leitos disponíveis no país; enquanto 55% dos leitos instalados estão voltados para atender 25% da população que pode pagar planos de saúde. Uma discrepância numa sociedade que se mobilizou para incluir no texto constitucional de 1988 que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado.
Leonardo Mattos, um dos coordenadores da campanha Leitos para Todos, aponta a gravidade desse problema. “Seria trágico durante a pandemia essa divisão entre usuários de planos de saúde e paciente do SUS permanecer, porque ela vai bater na dificuldade de acesso por falta de pagamento”. Ele ainda complementa: “Essa relação entre público e privado neste momento causa uma ineficiência na utilização desses recursos porque você não tem uma racionalidade no acesso. Você não se baseia só em critérios clínicos, tem a capacidade de pagamento envolvida nisso” explica Mattos, que ainda antes da unificação das campanhas já vinha pautando esse debate na mídia. A Abrasco, que já havia abraçado e apoiado junto com outras entidades da saúde a campanha Leito para Todos , realiza nesta terça-feira, 21 de abril, dentro da Programação da Ágora Abrasco, o colóquio Reorganização e expansão da assistência hospitalar para o atendimento da Covid-19: onde estamos? O que fazer? ,às 15 horas.
A necessidade de medidas por parte do poder público é algo apontado como urgente pelo fato de a capacidade dos hospitais públicos estar perto de sua saturação. Pedro Serrano, que lançou a iniciativa Vidas Iguais e agora compõe a coordenação integrada das ações, ressalta: “Nossa Constituição determina que o direito à vida deve preponderar em relação aos direitos patrimoniais. As vidas são iguais entre si”. Ele acrescenta que “lutar por isso é lutar por um fator de civilização” e lembra que diversos países europeus estão com os leitos unificados neste exato momento.
A manutenção da separação dos leitos diante de uma Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional, como aprovada pelo Ministério da Saúde, Congresso Nacional e Presidência da República, pode ser entendida como uma prática eugenia social, na visão do jurista. “Ou seja, vai acabar tendo a irreal situação de ter hospitais com absoluta falta de leitos, com gente pobre morrendo por isso, e hospitais usando leitos para fazer cirurgia plástica estética” analisa Serrano ao comentar a proposição da Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp) que pede o retorno das cirurgias eletivas.
Diálogo com outras ações: Além de pautar o tema na imprensa nacional, as campanhas Leitos para Todos e Vidas Iguais dialogam com ações já existentes de outras redes. “As iniciativas apresentadas pela campanha Vidas Iguais fazem parte do conjunto de ações da Rede Solidária em Defesa da Vida em Pernambuco, ações articuladas pela universidade e sociedade civil visando o apoio às redes de atenção, vigilância, comunicação social da Secretaria do Estado de Saúde” conta Bernadete Peres, docente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pernambuco (FM-UFPE) e vice-presidente da Abrasco.
Composta por lideranças de diversas entidades, a rede pernambucana tem mobilizado ações na mídia local e produzindo documentos técnicos em auxílio a gestão estadual da saúde. “Lançamos a campanha como uma medida de trazer a sociedade, trazer a entidades para discussão. O que estamos fazendo não tem intenção jurídica, mas sim, de sensibilizar, de chamar atenção e trazer as autoridades para pensar no assunto”, diz Bernadete Perez. “A vida de todo mundo é importante. A importância não se mede pela capacidade financeira, nem pelo status social. As vidas têm igualmente o mesmo valor. Não há diferença de raça, local onde mora. A utilização do SUS é universal”, acrescenta a vice-presidente da Abrasco em matéria ao site do Jornal do Commercio, principal jornal do Estado.
Assista à matéria da TVT com a participação de Leonardo Mattos e Francisco Campos Braga sobre a urgência na unificação dos leitos:
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