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ENTREVISTA: LUIS EUGENIO PORTELA

Do Laboratório de Pesquisas de Práticas de Integralidade em Saúde (LAPPIS).

O novo presidente da ABRASCO, Luis Eugenio Portela, tomou posse em outubro. De passagem pelo Rio, onde participou da reunião da Comissão Organizadora do VI Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, em dezembro último, ele conversou com o BoletIN. Nesta entrevista, Luis Eugenio revela suas expectativas para o encontro que vai acontecer este ano, com sede na UERJ, e apresenta seus planos e projetos para os dois anos que ficará à frente da associação.

 

BoletIN – O VI Congresso de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, que vai acontecer em outubro de 2013 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, vem sendo pensado com bastante antecedência, desde a temática até a logística. Como presidente da ABRASCO recém-empossado, quais as as suas expectativas?
Luis Eugenio Portela – São as melhores possíveis. Tenho muita confiança na Comissão de Ciências Sociais e Humanas da ABRASCO. Acho que a Comissão tá trabalhando já há bastante tempo com muita seriedade e tenho certeza que o Congresso vai ser um sucesso. Tanto do ponto de vista da discussão científica quanto do ponto de vista da organização, de permitir o intercâmbio. Fico muito feliz de poder sentir o compromisso e empenho de todos os membros da organização sob a liderança da professora Roseni Pinheiro (coordenadora do Lappis e vice-presiente da Comissão do VI CBCSHS). Agora, é enfrentar alguns desafios até que seja totalmente viabilizado.

BoletIN – Do ponto de vista científico, o que você espera desta edição do Congresso?
Luis Eugenio – Acho importante a gente garantir que o Congresso não apenas reflita a produção científica que vem sendo feita na área das Ciências Sociais e Humanas em Saúde, mas que ele também permita que se chegue a sínteses da produção desse conhecimento, indicando aquilo que está consolidado mas também aqueles pontos que precisam ser aprofundados, que necessitam de maior investimento acadêmico, que são polêmicos. Enfim, que seja não apenas um momento de troca mas também de amadurecimento do campo da saúde coletiva como um todo.

 

BoletIN – O senhor acaba de ser eleito presidente da ABRASCO. Quais os principais projetos a serem implementados durante a sua gestão?
Luis Eugenio – Nossa plataforma da chapa antes de se tornar diretoria está organizada em 3 grandes eixos. O primeiro eixo é continuar apoiando a consolidação da saúde coletiva como campo científico. O que implica em melhorar as revistas da saúde coletiva, implica em fazer congressos mais participativos e melhores, implica em articular e aproximar os diversos grupos de pesquisadores da área para, com isso, fortalecer as suas atividades de pesquisa, e implica ainda ocupar um espaço maior. A ABRASCO hoje ainda não ocupa todo o espaço que lhe é devido, que ela merece, nos espaços de formulação e deliberação das políticas de ciência e tecnologia. A gente tem um pleito inclusive de ter um assento no Conselho Diretor, no Conselho Deliberativo, no CNPq.

BoletIN – O segundo eixo de sua plataforma dizia respeito ao fortalecimento da luta pelo SUS enquanto sistema efetivamente único que garanta os princípios da universalidade, integralidade e igualdade. Como a ABRASCO pretende se colocar nessa luta?
Luis Eugenio – A ABRASCO precisa manter a sua tradição de inserção junto ao movimento social mais amplo de luta pela saúde igual para todos. Na verdade, esse movimento exige uma articulação da agenda específica da saúde com a agenda geral do movimento social. Se nos primórdios do movimento da reforma sanitária, essa sintonia do movimento especifico da saúde com o movimento geral da sociedade se deu através da luta pela democratização – lembre que “saúde é democracia” era o grande lema do movimento da reforma sanitária –, eu tenho uma hipótese de que hoje essa sintonia, essa convergência, do movimento da saúde com o movimento geral da sociedade possa se dar através da luta pelo desenvolvimento sustentável com igualdade, com inclusão social. Acho que a saúde é uma estratégia fundamental para que o crescimento econômico que o Brasil tá vivendo hoje não seja apenas o crescimento do seu PIB.

 

BoletIN – O tema do último ABRASCÃO, aliás, era esse: “Saúde é desenvolvimento”…
Luis Eugenio – Exatamente.

BoletIN – Na sua opinião, de que maneira a ciência e a pesquisa podem contribuir para o desenvolvimento do país e para um sistema de saúde universal?
Luis Eugenio – De muitas formas. O Sistema Único de Saúde precisa da produção do conhecimento para que a gente seja capaz de formular políticas adequadas às nossas necessidades de saúde. Não é evidente que formas organizativas devemos adotar pra implementar os princípios da universalidade, da igualdade e da integralidade. Na verdade essa é uma experiência histórica nova. Os brasileiros e os latinoamericanos de modo geral – considerando que, na última década, foi a única região do mundo em que as desigualdades sociais diminuíram – têm um desafio enorme de criar, a partir de sua experiência própria, novas formas de fazer saúde que de fato garantam esses princípios humanistas. E a reflexão crítica sobre as experiências que estão sendo desenvolvidas é fundamental para que se encontrem esses caminhos para levar ao SUS que a gente deseja. Então, a pesquisa parte da análise das práticas mas elas precisam retornar a prática com uma visão crítica sobre essas mesmas práticas.

 

BoletIN – Mas você diria que no Brasil estamos caminhando nessa direção?
Luis Eugenio – Não, pelo contrário. Eu acho que a tendência principal é a consolidação de um apartheid sanitário no nosso país em que as classes médias ou altas, do ponto de vista econômico-financeiro, utilizam o sistema público nos chamados procedimentos de alto custo e utilizam o sistema privado para procedimentos de custos médios ou baixos, enquanto o SUS fica como alterantiva exclusiva para aquelas pessoas mais pobres do ponto de vista econômico, que não podem pagar um plano de saúde e aí ficam com serviço de má qualidade. Nos serviços de boa qualidade do SUS, que são aqueles de alto custo, eles perdem pela competição em termos de acesso do ponto de vista social. Acho que, infelizmente, os dirigentes políticos do nosso país, independentemente do partido político ao qual pertencem, ainda não perceberam ou não incorporaram ou não concordam, por opção político-ideológica, com a ideia de que sem um Sistema Universal de Saúde nós não vamos ter um desenvolvimento sustentável com igualdade social. Eles mantêm a ilusão ou a opção política de apostar num Sistema de Saúde segmentado que vai ser um empecilho, um obstáculo, ao alcance de desenvolvimento com igualdade social.

BoletIN – O senhor falou de duas das três plataformas que vão orientar a sua gestão à frente da ABRASCO. Qual seria esse terceiro ponto norteador?
Luis Eugenio – O último são as questões de fortalecimento organizativas da ABRASCO. O campo da saúde coletiva cresceu muito. Hoje, nós somos mais de 70 programas de pós-graduação em saúde coletiva, mais de 20 cursos de graduação em saúde coletiva. A ABRASCO tem 6 mil associados e, no entanto, nossa estrutura organizativa não acompanhou. Falo do conjunto das comissões. Nós temos 4 comissões – de política, planejamento e gestão em saúde; de ciências sociais e humanas em saúde; de epidemiologia; e de ciência e tecnologia. E temos mais 14 grupos de trabalho ou grupos temáticos em diversas subáreas de saúde coletiva. E cada um funciona de uma forma, não existe uma padronização, as pessoas novas não sabem como ingressar nesses grupos ou nessas comissões. Em algumas, não há processo de renovação. Da mesma forma, a secretaria executiva tem uma estrutura ainda acanhada, pequena, pouco profissionalizada. Então, nós precisamos de fato definir um regimento que nos ajude a favorecer a participação direta de todos os associados e dar agilidade às decisões da ABRASCO. A gente precisa de mais pluralidade, mais espaço para o debate e, ao mesmo tempo, a gente precisa de mais agilidade nas decisões e de mais unidade na ação.

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