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Guia Alimentar para a população brasileira motiva debate sobre soberania alimentar

Estudantes, pesquisadores e profissionais de nutrição, gastronomia e demais áreas da saúde lotaram o Auditório Roxinho, um dos maiores do campus do Fundão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na última terça-feira, 24 de março. Numa intensa programação com mais de 10 horas de atividades, eles debateram os caminhos e os desafios para a promoção de uma alimentação adequada, saudável e soberana em nosso país. Organizado pelo Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia (HCTE/UFRJ) em parceria com o Instituto de Nutrição Josué de Castro (INJC/UFRJ), o evento Conhecer e Comer: Caminhos para redescobrir a comida de verdade serviu para expôr essas novas perspectivas do campo a luz do novo Guia Alimentar para a População Brasileira, apresentando a publicação ao público carioca na busca de consolida-la como instrumento de formação, orientação e inspiração para os profissionais e para a sociedade.

o evento reuniu nomes como Carlos Augusto Monteiro, coordenador do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Saúde e Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (NUPENS/FSP/USP) e coordenador técnico da publicação do Ministério da Saúde; Maria Emília Pacheco, presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea); representantes dos Ministérios de Desenvolvimento Social e da Saúde; pesquisadores ligados ao Grupo Temático de Alimentação e Nutrição em Saúde Coletiva (GT ANSC/Abrasco) e demais estudiosos e autodidatas no tema.

Em nome da organização, a professora Glória da Veiga, diretora do INJC/UFRJ, destacou o convite recebido pelo HCTE e ressaltou a importância do evento em dar acesso ao Guia para o conjunto da população, indo além dos profissionais da Nutrição e dos segmentos médios e altos da sociedade. “Esses eventos de divulgação são fundamentais para motivar a leitura e dar chance de conhecimento e implementação. Esse é o grande desafio”.

O Guia no front da Segurança Alimentar: Lançado no início de novembro do ano passado, o novo guia alimentar brasileiro ganhou notoriedade no cenário nacional e internacional por trazer uma moderna abordagem em relação ao alimento, deixando de lado a visão restritiva da ingestão dos micronutrientes para adotar o grau e a finalidade do processamento como definidor das escolhas alimentares, além de valorizar questões como a centralidade da refeição, seu papel como patrimônio alimentar, hábitos como a comensalidade, entre outros.

Em sua conferência, o professor Carlos Monteiro historicizou o processo de redação do Guia, iniciado em 2011 e que contou com cerca de três mil contribuições durante a Consulta Pública, realizada em maio de 2014. Desde o início, a equipe do NUPENS e da Coordenadoria-Geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde (CGAN/MS) desejaram e apostaram na necessidade de ultrapassar a visão medicalizada da alimentação como uma mera reposição de macro e micronutrientes ao corpo humano. “Alimentos, organismos ou parte dos organismos são estruturas complexas que carregam em si uma lógica e sentido evolucionários, ao fato em que os ultraprocessados são cópias pobres dos alimentos”, destacou Monteiro, reforçando que a discussão até então travada só interessava às indústrias. Confira aqui a entrevista exclusiva com o professor Carlos Monteiro.

A segunda conferência foi proferida por Maria Emília Pacheco, presidente do Consea e assessora da ONG FASE. Ela iniciou a fala abordando o ataque que o movimento pela Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) vem enfrentando no Congresso Nacional em várias frentes, como a tentativa de acabar com a rotulagem dos alimentos transgênicos (Projeto de Lei 4.148, de 2008), e retirar da alçada do Executivo a responsabilidade pela demarcação das terras indígenas e quilombolas. “Vemos essa falta de compreensão sobre o direito à soberania alimentar inclusive em órgãos do Ministério da Saúde, como a Anvisa, que traz uma proposta de regulação sanitária que não respeita as condições dos pequenos agricultores, nem leva em conta as considerações sócio-ambientais”.

A participação da Abrasco: As professoras Inês Rugani, diretora do Instituto de Nutrição da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (INU/Uerj) e Luciene Burlandy, da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal Fluminense (FN/UFF), ambas integrantes do GT ANSC/Abrasco, compuseram duas mesas do encontro, trazendo importantes contribuições ao debate.

Ainda na parte da manhã, no painel intitulado Alimentos Ultraprocessados: Conveniência para quem?, Inês destacou a importância de ter no Guia uma voz oficial que fale em função do interesse público em meio a uma disputa assimétrica travada com a indústria alimentícia e com o aparato da publicidade. “O discurso da conveniência pega a falta de tempo na sociedade contemporânea, uma questão legítima, e a transforma em fetiche, tornando valor em si, perdendo o vínculo com a praticidade. Em que medida a conveniência pauta realmente das nossas escolhas?”, questionou Inês, ressaltando que as opções feitas por todos no cotidiano evidenciam os modelos alimentares em voga. A mesa, mediada pelo professor Alexandre Brasil, do Nutes/CCS/UFRJ, contou ainda com as professoras Cláudia Olsieski, do curso de Nutrição da Universidade Estácio de Sá e Giane Molinari, da Escola de Nutrição da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio).

Já à tarde, no painel Soberania alimentar, soberania consumidora e cidadã, Luciene Burlandy abordou os obstáculos e os desafios abertos no caminho da implementação do Guia Alimentar, como as disputas dos modelos alimentares dentro da própria esfera do governo, citando como exemplo os  modelos opostos e conflitantes defendidos pelos Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). “Enfrentar esses obstáculos é praticamente impossível. Por isso, dependemos de políticas de regulação e taxação, pois é onde se dá justamente os maiores conflitos”, frisou Luciane, iluminando o porquê de não ser possível acreditar nas propostas de auto-regulação apresentadas pela indústria. A professora ressaltou ainda o estímulo que o governo pode dar ao debate por ser um importante comprador de alimentos e as iniciativas da sociedade civil em aprimorar e propôr políticas públicas que busquem equilibrar a disputa de forças no cenário da alimentação e da nutrição. Compuseram também a mesa Eduardo Nilson, coordenador-geral de alimentação e nutrição do Ministério da Saúde (CGAN/MS) e Daniela Frozi, do Programa de Alimentação, Saúde e Cultura (PALIN/Fiocruz DF). A mediação foi de Renato Maluf, do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ).

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