O Movimento da Reforma Sanitária entre os seus diversos mecanismos e estratégias de atuação, tem tentado por diferentes meios e em diversos momentos um diálogo com representantes do Governo para manifestar preocupações e compartilhar análises sobre a saúde no Brasil.
Finalmente, na ultima sexta 27/03/2015, representantes das entidades do Movimento da Reforma Sanitária foram recebidas pelo Ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto. Na agenda a conjuntura setorial, com destaque para recentes medidas tomadas pelo Governo e pelo Congresso que configuram graves ameaças ao direito universal à saúde.
Sobre as medidas aprovadas no Congresso Nacional e sancionadas pela Presidenta Dilma, particularmente a entrada do capital estrangeiro na atenção à saúde, apresentamos nosso posicionamento de tal medida fortalecendo o setor privado e a mercantilizacão crescente da saúde no país. Ao ser informado sobre a iniciativa de apresentação de uma ADIN contra a medida, o Ministro mostrou-se surpreso. Ressaltamos que as referidas medidas legislativas – a Lei Federal nº 13.097/2015 e a EC 86/2015, descortinam um cenário onde forças organizadas contrárias à consolidação do direito à saúde – com base em um sistema único de natureza pública e universal – se movimentam para impor um grande retrocesso social através:
- da abertura indiscriminada da assistência à saúde ao capital estrangeiro, sem qualquer regulação prévia, afrontando o disposto na Constituição Federal art. 199 § 3º que visava proteger o sistema de saúde e os recursos brasileiros;
- da redução do financiamento para a saúde, ao definir que a União deverá destinar apenas 15% das suas receitas correntes líquidas (em cinco anos), ao invés dos 10% de suas receitas correntes brutas, que corresponderiam a 18,7% da RCL, como proposto por projeto de lei de iniciativa popular;
Foi ainda debatida com o Ministro, a proposta de emenda à Constituição apresentada pelo Deputado Eduardo Cunha, a PEC 451/2014. Reivindicamos posicionamento urgente do Governo em relação a essa PEC. Em simples e diretas palavras, ela desresponsabiliza o Estado em relação ao dever de garantir o direito à atenção universal e integral à saúde, ao transferi-lo para os empregadores por meio da contratação obrigatória de planos privados de saúde. É sabido que tais planos não garantem assistência nas situações de desemprego, aposentadoria e viuvez. Em suma, a PEC 451/2014 reduz um direito social universal à saúde, a um direito trabalhista.
As entidades entregaram as Notas emitidas e documentos divulgados que embasam as críticas e o repúdio das entidades do Movimento Sanitário a tais medidas.
O Ministro indagou sobre a percepção das entidades a respeito do Programa “Mais Médicos”, considerado a principal medida do governo no campo da saúde na última gestão. As representantes das entidades reconheceram o significado do Programa ao tocar em um campo critico para a saúde no país e pelo enfrentamento politico que significa, esclarecendo, entretanto, sua insuficiência para resolver os problemas centrais relacionados à capacidade de oferta regular de profissionais médicos e não médicos, conforme as necessidades do SUS. Foi destacada a importância de não se considerar as respostas do Programa “Mais Médicos” como substitutivas do grave problema do adequado financiamento para garantir o direito à saúde via políticas públicas sociais e econômicas. Alertaram inclusive que, sem avanços neste aspecto, o próprio Programa “Mais Médicos” corre o risco de ser reduzido em seus impactos reais sobre a saúde.
O Ministro então afirmou que de fato é muito importante ouvir, e manifestou sua posição concordante de que o SUS deve ser o centro da ação
governamental em saúde, ao que retrucamos, que a retomada do sentido constitucional para o SUS, enquanto sistema ÚNICO, com governabilidade sobre o setor da saúde é o que esperamos desde sempre dos governos populares. Também manifestamos que, em nossa avaliação, estamos nos distanciando destes preceitos constitucionais e é urgente a posição e a retomada do Governo em direção ao compromisso constitucional da saúde como direito, e não como assunto para o mercado. Salientamos que nos últimos anos o mercado privado de prestação de serviços em saúde tem expandido de fato, e que é inconcebível a omissão do Estado na defesa da saúde como direito.
Diante da manifestação sobre a necessidade de maior canal de diálogo entre o Movimento da Reforma Sanitária e o Governo, as representantes das entidades manifestaram sua expectativa de que o Movimento da Reforma Sanitária seja considerado interlocutor nos temas relacionados à saúde no país, invertendo a assimetria com que são tratadas as entidades do setor privado. Com a promessa de que o Ministro iria debater o tema e nossos posicionamentos com o Ministro da Saúde, a reunião foi finalizada.
Em nossa avaliação esta reunião foi importante, pois, ao que ficou evidente, as analises do MRSB quanto aos últimos e graves acontecimentos, não haviam chegado até o Palácio o que, necessariamente não muda a correlação de forças mas amplia a chance de entendimento e clareza quanto ao que está sendo decidido e encaminhado na contramão do direito à saúde.
Assinam essa avaliação e perspectivas as seguintes entidades constituintes do Movimento pela Reforma Sanitária Brasileira:
Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO
Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABRES
Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde – AMPASA
Associação Paulista de Saúde Pública – APSP
Centro Brasileiro de Estudos em Saúde – CEBES
Instituto de Direito Sanitário – IDISA
Sociedade Brasileira de Bioética – SBB