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 POSICIONAMENTO ABRASCO 

Nota: em defesa do cuidado em liberdade e dos Direitos Humanos

Associação Brasileira de Saúde Coletiva

Foto: Bloco Loucura Suburbana / Riotur

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva manifesta e reitera seu apoio às políticas de saúde mental que se pautam no cuidado em liberdade, em rede e territorial. Recentemente,  vimos mais um exemplo de uma situação que não raro se repete no país e que contraria frontalmente os princípios do SUS, da Reforma Psiquiátrica brasileira e da dignidade humana.

Veio à tona pelos meios de comunicação, no dia 25 de fevereiro, a história de Maria Aparecida Paiva, uma carioca de 65 anos de idade, que relatou o desespero de ter sido internada em uma clínica psiquiátrica, contra sua vontade, devido a conflitos familiares com suposta motivação financeira.  O direito humano à liberdade é prerrogativa inalienável da democracia plena, sendo esse princípio fundamental da Constituição Federal Brasileira de 1988. Entretanto, nossa história é repleta de relatos do uso do aparato manicomial como instrumento do poder colonial, patriarcal, racista, idadista e elitista que incide de forma mais aguda em populações vulnerabilizadas, entre os quais as mulheres, pessoas idosas e pessoas negras são alvos preferenciais. A lógica manicomial, fundamentada no “excluir para tratar” persiste fazendo suas vítimas. Por vezes, a institucionalização de pessoas idosas em abrigos se reveste da mesma lógica, mascarada de um “cuidado” totalizante, viola direitos humanos e produz importantes desigualdades.

O episódio de Maria Aparecida Paiva atualiza este uso nefasto de que a cultura patriarcal sempre se valeu para retirar mulheres dos espaços públicos e convívio social por ousarem querer desfrutar de suas liberdades, seja votando, manifestando suas opiniões, não desposando quem lhes designavam, engravidando de seus amantes, ou decidindo sobre seus corpos. Relatos como o de Maria Aparecida já foram mais frequentes, mas com envelhecimento e empobrecimento da população brasileira, as pessoas idosas, muitas vezes mantenedores de suas famílias, passam a compor os alvos preferenciais da lógica da exclusão, estando ainda mais sujeitos a explorações e maus tratos. Foi, exatamente, em resposta às inúmeras denúncias de violações dos direitos humanos como esta que a assistência à saúde mental no Brasil atravessou profundas e importantes mudanças desde a promulgação da constituição de 1988.

A Lei 10.216, de abril de 2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redirecionou o modelo assistencial em saúde mental da matriz manicomial, hospitalocêntrica, para uma rede de serviços pautados no cuidado em liberdade, na promoção de autonomia e no respeito às decisões de todas as pessoas com algum sofrimento mental foi um marco neste processo. Além disso, a lei 10.216 regulamentou os passos para a internação involuntária e compulsória no Brasil. A “atenção” asilar, que se fortaleceu no último governo, continua servindo a propósitos de exclusão dos indesejados pela sociedade.  Por isso, reiteramos nossa defesa por uma rede de saúde mental publica baseada na Atenção Básica, nas Unidades de Acolhimento, em Centros de Convivências, em Centros de Atenção Psicossocial, Leitos de Internação em Hospitais Gerais gerenciados pelos SUS e que tenham instâncias de regulação que impeçam que a violência ocorrida como a de Maria Aparecida Paiva, que ainda ocorre com diversas mulheres, pessoas idosas, negros e negras principalmente, volte a acontecer.

Nesse contexto, a Abrasco defende a apuração dos fatos e o cumprimento da lei, e repudia todas as ações contra a lógica do cuidado em liberdade e relembra que defender a Reforma Psiquiátrica e a luta antimanicomial brasileira é defender a democracia os direitos humanos de todos, todas e todes nós.

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