Como acontece desde 2011, a cada ano mais usuários vão ao tribunal para garantir o atendimento que as operadoras se negam a prestar. De acordo com o dado mais recente do Observatório da Judicialização da Saúde Suplementar do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, o volume de processos nos nove primeiros meses do ano é mais de quatro vezes maior do que no mesmo período de 2011, quando os dados passaram a ser analisados. O Observatório da Judicialização da Saúde Suplementar do Departamento de Medicina Preventiva Faculdade de Medicina da USP é coordenador pelo professor Mario Scheffer, membro da Comissão de Política da Abrasco.
De janeiro a setembro, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) julgou 23.067 ações movidas por usuários. São 13.976 ações na primeira instância e 9.091 em segunda. Levando-se em conta os 181 dias úteis do tribunal no ano, o dado corresponde a número considerável de 120,8 decisões por dia.
ações contra planos de saúde.
O que mais tem levado essas pessoas a acionar a Justiça é a exclusão de coberturas ou negativas das operadoras de cobrir atendimentos. E entre os procedimentos e atendimentos mais negados pelas empresas de saúde privada estão cirurgias, internações, inclusive em UTI, e tratamentos para doentes com câncer.
Na sequência vêm questões que prejudicam mais as pessoas idosas, como a manutenção do aposentado no contrato coletivo e reajuste abusivo de mensalidades. De acordo com o levantamento, realizada pelos pesquisadores Rafael Robba e Juliana Kozan, a decisão dos magistrados tem sido favorável aos usuários na maior parte dos casos. E as chances de as operadoras virem a ter êxito em instâncias superiores são pequenas.
Nos anos de 2013 e 2014, as reclamação dos usuários foram acatadas pelos magistrados em cerca de 4 mil decisões de segunda instância do TJSP. Isso significa que 92,4% dos acórdãos reconheceram a razão do usuário, sendo que em 88% dos casos o pleito foi integralmente acolhido e em outros 4,4% a pretensão foi acolhida em parte. Em apenas 7,4% dos julgados a decisão foi favorável à empresa de plano de saúde.
Com base nesses dados, os pesquisadores acreditam que são grandes as chances de êxito do cidadão ao propor uma ação judicial contra a omissão das operadoras de planos de saúde. Segundo eles, é pouco provável que ocorra a revisão da decisão de segunda instância e dificilmente a operadora conseguiria recorrer ao Superior Tribunal de Justiça, já que esbarraria nas vedações da Súmula nº 5 (“a simples interpretação de cláusula contratual não enseja Recurso Especial) e da Súmula nº 7 (“a pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial”).
Confira a íntegra do estudo clicando aqui.
As derrotas das operadoras nos tribunais comprovam que a atual legislação dos planos de saúde tem de ser melhorada. É o que avalia Mario Scheffer. “Os dados sinalizam que legislação atual dá liberdade para as operadoras negar cobertura, fazer reajustes abusivos, expulsar idosos, fora os inúmeros problemas com os planos ‘falsos coletivos’, esses que os corretores oferecem para pessoas e famílias obrigando a apresentação de um CNPJ ou a filiação a uma entidade qualquer, uma fraude que ganhou mercado desde a extinção da venda dos planos individuais”.
E o que ocorre, como ele lembra, é o movimento inverso, no sentido de retirada de direitos, com o estudo de reforma da atual lei dos planos de saúde. A situação pode piorar para os usuários de planos porque a nova lei deverá atender aos interesses das empresas e também porque a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), dominada por executivos dos planos de saúde, vem piorando.
“O PMDB, que sempre obteve ganhos com a indicação ou aprovação de executivos desse mercado para diretorias da ANS, agora indica a cargos estratégicos servidores de carreira da própria agência. As recentes mudanças de regras de fiscalização que favorecem os planos e o relatório da ANS, que trata com normalidade os chamados planos acessíveis, mostram que operadoras e políticos denunciados continuam mandando ali”, aponta Scheffer.
Outra constatação, segundo ele, é que o atual ministro da Saúde, Ricardo Barros, é de fato o “ministro dos planos de saúde”, que articula com a Câmara e com a ANS as mudanças que favorecem as empresas de saúde privada.
No dia 13 de setembro, a Agência Nacional de Saúde Suplementar aprovou relatório em que reconhece os chamados planos de saúde acessíveis, que cobram mensalidades mais baixas justamente porque oferecem cobertura reduzida. Além disso, a agência autorizou a coparticipação, mecanismo pelo qual a operadora pode cobrar do usuário o pagamento de parte do serviço, e acabou com a obrigação dos planos ambulatoriais garantir a internação de emergência a seus usuários nas primeiras 24 horas de vigência do contrato. (Da RBA)