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O ataque às PDP’S: mais um tiro contra o SUS!

Na atual carnificina promovida diariamente pela grande imprensa visando as campanhas eleitorais de outubro, vem se destacando um tema envolvendo o Ministério da Saúde. Muito provável é que o objetivo central seja o de atingir a candidatura do ex-ministro Alexandre Padilha ao governo do Estado de São Paulo, mas deixarei essa dimensão de fora deste texto. Meu interesse é alertar os associados da Abrasco para o crescente ataque a uma das políticas mais inovadoras desenvolvidas no âmbito do SUS nos últimos anos. Refiro-me à política de desenvolvimento produtivo, que tem sido a expressão prática de uma revisão conceitual das relações entre saúde e desenvolvimento no Brasil e que tem entre suas ferramentas a constituição das parcerias para o desenvolvimento e produção no país de medicamentos e outros produtos industriais de saúde (as PDP’s).

A política tem outros componentes igualmente relevantes já devidamente normatizados, quais sejam a questão das compras governamentais e a definição e a publicidade dos produtos industriais estratégicos para o SUS. Deve ser mencionada também a construção de um ambiente de discussão intra e extragovernamental com vistas à pactuação das relações entre setor púbico e privado nesse terreno, que é o Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde (GECIS). Finalmente, ao lado de ser um instrumento de fortalecimento do SUS, na medida em que aumenta o que poderíamos denominar de ‘segurança farmacêutica e industrial’, a mencionada política está 100% inscrita e cada vez mais articulada com as sucessivas políticas industriais brasileiras desde 2004.

No ventre da carnificina midiático-eleitoral, o que está sendo gestado é um caminho de destruição dessa bem sucedida política. É claro que há interesses contrariados, em particular os interesses comerciais da indústria farmacêutica internacional sediada no Brasil. Indústria essa que vive uma crise tecnológica global e que explora saídas da mesma com a utilização de estratégias comerciais francamente heterodoxas e que cada vez mais adentram o capítulo das transgressões morais. A prova disso são as condenações e multas milionárias que vêm sofrendo pelo mundo afora. Por outro lado trata-se da indústria que, no Brasil, é a principal responsável pelo déficit da balança comercial setorial, que está hoje em mais de 11 bilhões de dólares. Indústria que, desde a desastrada abertura comercial da década de 1990, diminuiu radicalmente seus investimentos produtivos no país.

A Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades – ABIFINA vem participando da construção e da implementação da política de desenvolvimento produtivo desde os seus primeiros tempos e vem manifestar a sua preocupação com os ataques que essa política começa a sofrer. Entende que a sua extinção e mesmo o seu enfraquecimento terão impacto tanto no SUS quanto no desenvolvimento do complexo industrial da saúde no Brasil. Com o objetivo de tornar conhecida a sua posição nessa questão, enviou ao ministro Arthur Chioro carta assinada pelo seu 1º Vice-presidente, Nelson Brasil de Oliveira, que transcrevo abaixo.

Senhor ministro,

Dentre as principais iniciativas desenvolvidas pelo Ministério da Saúde nos governos do presidente Lula e da presidenta Dilma Rousseff, está, sem dúvida, a participação dos gestores do Sistema Único de Saúde na construção e desenvolvimento de políticas para o Complexo Industrial da Saúde no Brasil.

Nesse período, a política pública de saúde, paulatinamente, incorporou às suas responsabilidades um conjunto de temas que no Brasil era, anteriormente, de interesse exclusivo dos ministérios da área econômica, de comércio exterior e de ciência e tecnologia. Isso foi feito mediante a construção de uma política para o Complexo Industrial da Saúde que se estruturou a partir de uma articulação de vários componentes, até então isolados ou mesmo ausentes no âmbito da política de saúde. Foram eles: (1) a pesquisa e desenvolvimento em saúde; (2) a avaliação tecnológica em saúde e a coordenação das ações sobre a incorporação de tecnologias no SUS; (3) a reforma da Assistência Farmacêutica no SUS; (4) o fomento e a regulação no âmbito do Complexo Industrial da Saúde.

Em 2007, no início do segundo mandato do presidente Lula, o ministério definiu como estratégia prioritária o desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde mediante uma visão integrada de desenvolvimento econômico e desenvolvimento social, abordagem que também foi incorporada nas duas últimas versões da política industrial do governo federal (Política de Desenvolvimento Produtivo e Brasil Maior). Em ambas, o segmento industrial voltado à saúde humana foi incluído entre os setores estratégicos e portadores de futuro.

Com o objetivo de coordenar as ações voltadas ao fomento do complexo industrial da saúde, em particular o seu componente dedicado ao mercado público, foi criado o Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde (GECIS), por Decreto Presidencial de 12 de maio de 2008. O GECIS tem como objetivo promover medidas e ações concretas para implantação do marco regulatório brasileiro que atendam aos objetivos estabelecidos pela política industrial e a política de saúde. Ele é um órgão de articulação intragovernamental que incorpora também um Fórum de Articulação, cujo objetivo é promover o diálogo entre o Governo e a sociedade civil, incluindo as entidades representativas das empresas que compõem o CIS.

No processo de implantação dessa estratégia, foi gerado ainda um conjunto de decisões normativas governamentais, dentre elas as seguintes:

  • Portaria Interministerial nº 128/08 (MS, MCT, MDIC e MPOG) – Estabeleceu diretrizes para a contratação pública de Medicamentos e Fármacos pelo SUS (qualidade de insumos utilizados nos laboratórios públicos).
  • Portaria MS nº 3031/08 – Dispôs sobre critérios a serem considerados pelos Laboratórios Oficiais de produção de medicamentos em suas licitações para aquisição de matéria-prima. (orientação para a compra de insumos em farmoquímicas nacionais)
  • Portaria MS nº 374/08 – Instituiu, no âmbito do SUS, o Programa Nacional de Fomento à Produção Pública e Inovação no Complexo Industrial da Saúde.
  • Portaria MS nº 978/08 – Dispôs sobre a Lista de produtos estratégicos prioritários para o CIS e o SUS. (orientação para o mercado – CIS), cuja revisão foi publicada em 26 de maio de 2010 pela Portaria MS nº 1284/10 e, mais recentemente pela portaria Nº 3.089, de 11 de Dezembro de 2013.
  • Lei nº 12.349/10, de 15/12/2010 – Introduziu alterações na Lei de Licitações para incluir dentre seus objetivos a promoção do desenvolvimento nacional sustentável em áreas estratégicas, para tanto admitindo a utilização de margens de preferências nas licitações públicas destinadas às aquisições de produtos manufaturados no país, e que foi regulamentada para produtos destinados à área da saúde pelo Decreto nº 7.713, de 03 de abril de 2012.
  • Lei nº 12.715, de 17 de setembro de 2012, que através de seu artigo nº 73 alterou o artigo nº 24 da Lei de Licitações (Lei nº 8.666) para incluir, dentre as situações em que poderão ser dispensadas licitações públicas, a contratação em que houver transferência de tecnologia de produtos estratégicos para o Sistema Único de Saúde, no âmbito da Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, conforme elencados em ato da direção nacional do SUS, inclusive por ocasião da aquisição destes produtos durante as etapas de absorção tecnológica.

No processo de construção da política, destaque-se também a ampla articulação entre produtores públicos e privados que possibilitou o estabelecimento das parcerias para o desenvolvimento produtivo (PDP’s) de medicamentos, vacinas, equipamentos e dispositivos diagnósticos, essenciais para o mercado público. Atualmente, já foram estabelecidas mais de uma centena de parcerias, cujo desenvolvimento completo será completado no médio prazo e que, numa projeção conservadora, gerarão uma economia de mais de R$ 3 bilhões ao nosso SUS.

Por oportuno deve ser ressaltado que a implantação dessa política, da qual resultou a construção de tais PDPs, foi feita de uma maneira totalmente transparente, com a validação expressa de decisões através de periódicas reuniões do GECIS, processo decisório límpido que não deve ser abandonado.

É com imenso pesar que a ABIFINA, componente do Fórum de Articulação do GECIS com a sociedade civil, testemunha neste momento um ataque a essa importante construção política, sob o argumento de possível ocorrência de malfeitos no seu âmbito. O estabelecimento de um pré-acordo para o desenvolvimento e produção de um importante medicamento para a hipertensão pulmonar, desacompanhado de qualquer desembolso de recursos financeiros públicos, tem sido apresentado como indício do fracasso ou, pelo menos, de fragilidades da política de desenvolvimento produtivo do ministério.

Além disso, senhor ministro, esse ataque vem sendo insidiosamente acompanhado de absurdas sugestões de má conduta por parte de componentes da exemplar equipe que coordena a política, no âmbito da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos.

Felizmente, a ABIFINA observa que o ministério sob a liderança de Vossa Excelência, vem tomando tempestivamente as medidas necessárias tanto para esclarecer o público sobre os fatos ocorridos, quanto para garantir a sustentabilidade dessa política. Que, a nosso ver, não deve prescindir da continuidade operacional oferecida pela equipe liderada pelo Dr. Carlos Gadelha.

Na certeza da continuidade dessas medidas que compõem essa relevante política pública, e confiantes no esclarecimento de todos os fatos que vêm sendo, por vezes maldosamente, ventilados por parte da imprensa, queremos manifestar todo o nosso apoio à continuidade dessa política, haja vista os imensos benefícios que já está trazendo e ainda trará ao SUS e à indústria nacional na área da saúde humana.

Além disso, a ABIFINA fica à disposição de Vossa Excelência para eventuais esclarecimentos suplementares quanto à política de desenvolvimento produtivo e ao papel da cadeia industrial da química fina em apoio da mesma.

 *Reinaldo Guimarães é médico sanitarista, e atualmente está como 2º Vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (ABIFINA).

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