A sua saúde, a qualidade dos alimentos, a água que você bebe e a fauna e flora brasileira são algumas das questões em risco com o Projeto de Lei (PL) 1.459 de 2022, denominado Pacote do Veneno. A proposta, aprovada em 28 de novembro no Senado Federal, flexibiliza a licença e venda de novos agrotóxicos e afrouxa as ações de fiscalização e controle, fundamentais para a Saúde Pública. O texto agora vai para o presidente Lula, que pode sancionar, vetar partes ou todo o texto do PL. Acompanhe e entenda, ponto a ponto, os perigos desta proposta para a sociedade, que vai impactar a vida de milhões de brasileiros.
Quais as mudanças o Pacote do Veneno prevê?
Se for sancionada sem vetos presidenciais o registro de agrotóxicos ficará concentrado no Ministério da Agricultura, o que vai restringir a atribuição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), colocando em risco a saúde da população brasileira e o meio ambiente.
Além disso, há uma flexibilização de todos os critérios de risco dessas substâncias colocados na Lei original, como substâncias cancerígenas, que passariam a ser apenas “risco inaceitável”, o que abre margem para interpretação.
Quais os riscos?
Caso seja sancionado, o novo texto vai favorecer os interesses do agronegócio, ameaçando diretamente a saúde dos brasileiros. Os principais riscos são:
1. Contaminação de água e comida: a pulverização de agrotóxicos, especialmente a feita com aeronaves, já traz riscos para as pessoas. Com a liberação e uso de substâncias mais pesadas, sem fiscalização adequada, aumenta a possibilidade de contaminação dos lençóis freáticos e dos alimentos consumidos pela população.
2. Doenças e problemas de saúde: o afrouxamento dos critérios de risco para uso de agrotóxicos facilita o uso de substâncias cancerígenas e que causam outros problemas de saúde, como ao sistema reprodutor, por exemplo.
3. Ameaça ao Cerrado: 52% da área de cultivo de soja no país se concentra no Cerrado, num território que corresponde a 20 milhões de hectares. O uso de agrotóxicos de maior toxicidade na região vai comprometer a biodiversidade e as populações que habitam o local.
Sob protestos e críticas: organizações da sociedade civil se manifestam contra a PL do Veneno
Em repúdio ao PL, mais de 230 organizações e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) lançaram um manifesto contra o PL do Veneno.
“Conforme temos denunciado ao longo de quase dez anos, o Pacote do Veneno é um projeto de lei voltado exclusivamente para garantir os interesses do agronegócio e das multinacionais agroquímicas. Seu objetivo nunca foi “modernizar a legislação atrasada de agrotóxicos no Brasil”, mas sim revogar a Lei 7.802/1989, atualmente em vigor, para permitir o registro de agrotóxicos cancerígenos; acabar com o nome “agrotóxico” para maquiar a realidade; acelerar prazos de registro; e permitir um uso ainda maior de venenos em nosso país.” destacam as associações no texto do manifesto.
A Abrasco possui dossiês sobre os riscos do uso de agrotóxicos e PL do Veneno e continua firme na luta para proteger a saúde da população brasileira e o meio ambiente.
Contexto histórico: entenda os caminhos da PL do Veneno
Logo após a redemocratização, com a Constituição de 1988, no dia 11 de julho de 1989, o então presidente José Sarney sancionou a Lei Nº 7.802. Aprovado no Congresso, o texto passou a ser conhecido como Lei de Agrotóxicos e regulamentou a a produção, exportação, importação e uso dos agrotóxicos. As normas foram consideradas “rigorosas” por setores do agronegócio, que desde então tenta flexibilizar o texto.
Para contextualizar, a Lei Nº 7.802 considerou os riscos existentes no uso desregulado dessas substâncias e proibiu o registro de agrotóxicos da seguinte maneira:
- 1 – componentes que não tenham métodos para desativação – e evitar que os resíduos continuem no ambiente;
- 2 – se não houver antídoto ou tratamento no Brasil;
- 3 – com características cancerígenas;
- 4 – risco de provocar distúrbios hormonais e no aparelho reprodutor;
- 5 – perigo ao ser humano identificado em testes de laboratório;
- 6 – com características que causem danos ao meio ambiente.
A lei ainda estabeleceu a necessidade de registro desses produtos em órgãos federais, responsáveis pelos setores da saúde, meio ambiente e agricultura. O texto também previu as condições necessárias para produção, armazenamento e rotulagem, no intuito de proteger a população e o meio ambiente.
Pouco mais de 10 anos depois, o texto original da lei passou por algumas modificações quando o Congresso aprovou alterações no texto, na Lei Nº 9.974, sancionada em 6 de junho de 2000 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Entre as novidades, estava a permissão para fracionar e reembalar agrotóxicos, prática antes proibida.
As tentativas de flexibilização da antiga lei com o objetivo de facilitar o uso de agrotóxicos no Brasil não pararam por aí. Em 2002, o Senador Blairo Maggi (S/Partido/MT), figura conhecida da bancada ruralista, enviou a PL 6299 de 2002, que mais uma vez tentava alterar a Lei de Agrotóxicos.
O PL não avançou até 2022, quando a Câmara dos Deputados sugeriu uma alternativa ao texto antigo – um substitutivo, que passou a ser o Projeto de Lei N° 1459, de 2022. Versão aprovada na Câmara e no Senado e que seguiu para sanção presidencial no último dia 28 de setembro.