Desde o início da pandemia da Covid-19, em março de 2020, o Brasil não teve uma política consistente de testagem no âmbito do SUS. Na visão da Frente pela Vida, isso representa mais uma atitude negligente do atual governo no enfrentamento da pandemia, que atua em favor do vírus, e não do seu controle.
Infelizmente, sabemos que a política de enfrentamento à pandemia em nosso país acumula desvios e fracassos: a subnotificação de casos da doença devido à baixa disponibilidade de testes; a insuficiência da vigilância genômica; a ausência de uma política de distribuição de máscaras de qualidade à população; a falta de informações às pessoas sobre como utilizá-las da forma correta; sobre como fazer o isolamento; a falta de apoio aos que não têm com se isolar, e a dificuldade em transformar atendimentos clínicos em notificações para o sistema de vigilância epidemiológica, além das constantes medidas protelatórias à vacinação.
O Ministério da Saúde alega que o atual Plano Nacional de Expansão da Testagem para Covid-19. – PNE-Teste1 , lançado em setembro de 2021, configura uma política de testagem. Porém, basta analisar o documento-base do Plano para concluir que se trata de algo claramente insuficiente para a demanda no Brasil: o quantitativo de testes é muito pequeno, não há previsão de distribuição gratuita de testes e nem a possibilidade de autotestagem – política essa que vem sendo adotada com êxito em vários países, a exemplo da Argentina, Reino Unido, Israel, Estados Unidos, França e Alemanha.
Em relação ao autoteste, vivemos um impasse que prejudica sua adoção como ferramenta de contenção da transmissão. Recentemente, vimos um embate entre o Ministério da Saúde e a Anvisa. A Agência, extrapolando sua competência regulamentar, exige informações comprobatórias de que o Ministério da Saúde tem uma política pública formal para os autotestes, antes de analisar o pedido de liberação, ao passo que o Ministério da Saúde se contenta em pedir à Anvisa que libere a venda de autotestes em redes de drogarias, sem desenhar uma política à altura do desafio que enfrentamos.
Testes de antígeno são ferramentas fundamentais para romper as cadeias de transmissão, com base em políticas sobre quando testar e quando e como se isolar. Quanto mais difícil é o acesso à testagem, maior a probabilidade que pessoas infectadas sigam circulando, trabalhando e expondo outras pessoas. Portanto, testes rápidos de antígeno devem estar amplamente disponíveis, especialmente nas instituições de ensino, locais de trabalho, sistema prisional, eventos e em locais de grande circulação de pessoas. Além disso, a testagem precisa ser repetida e frequente, não se limitando a uma única vez, já que os testes de antígeno podem ser negativos quando realizados ainda fora da janela de transmissão, que tem variado entre as diferentes variantes do Sars-Cov-2.
Nos países em que os autotestes são utilizados, há uma política efetiva de comunicação em saúde para orientar as pessoas sobre como realizar a coleta, qual conduta adotar em caso de resultado positivo, e, sobretudo, como proceder para garantir que os resultados da testagem sejam rapidamente registrados no sistema de informação para fins de vigilância epidemiológica. A política de testagem, apesar de se caracterizar como política de saúde pública, deve encarar também os testes como um “direito individual” – o Estado tem que prover condições para que as pessoas saibam se estão infectadas e assim possam adotar a conduta correta.
Assim, a simples venda em drogarias não resolveria um dos problemas centrais da testagem: o acesso. Sem uma política clara e consistente do Ministério da Saúde para a massificação da disponibilidade de testes, estes permanecerão escassos, caros, e inacessíveis à boa parte da população. Será uma política de baixo impacto no controle da pandemia e alto na geração de desigualdades sociais no acesso. Além disso, as orientações vigentes parecem caminhar no sentido contrário à facilitação do acesso: no atual Guia Epidemiológico do Ministério da Saúde, exige-se, desnecessariamente, que os testes sejam realizados por profissionais de nível superior, o que limita ainda mais sua disponibilidade. Além disso, o Ministério da Saúde tem por responsabilidade definir, atualizar e divulgar amplamente as orientações sobre a testagem e isolamento com uma estratégia clara de comunicação
Por isso, a Frente pela Vida defende que os testes rápidos de antígenos sejam disponibilizados pelo SUS, e os autotestes distribuídos em locais elencados como prioritários como, por exemplo, as escolas e as universidades que estão em vias de retornar às aulas, em plena onda da Ômicron. Cabe ao SUS adquirir quantidade suficiente de testes, negociando preços e possibilitando sua difusão em todo o território nacional.
O Ministério da Saúde deveria ainda ter um olhar diferenciado para populações mais expostas, possibilitando a testagem frequente, como é o caso de profissionais de ensino, motoristas de ônibus, pessoas que atendem ao público, servidores do sistema penitenciário. Nestes casos, é essencial uma articulação intergovernamental para criar políticas específicas.
A população brasileira continua vivendo uma grande tragédia acentuada pelo descaso, especialmente do Ministério da Saúde. As medidas para reduzir a circulação do vírus não podem se subordinar aos prazos da hesitação ou da burocracia. Assim, a Frente pela Vida reforça a urgência e exige do Ministério da Saúde a disponibilização para toda a população brasileira do acesso a testagem ampla, acessível e rápida, indispensável para o controle da pandemia.
Rio de Janeiro, 25 de janeiro de 2022
Frente Pela Vida