As atividades, funções e potencialidades do trabalho desenvolvido pelos diversos profissionais do campo da Enfermagem estão em xeque com a revisão da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB). Esta é a avaliação de Maria Goretti David Lopes, assessora executiva do Conselho Regional de Enfermagem do Paraná -Coren PR. Para ela, as mudanças só pioram a prestação de serviço à população e agravam a invisibilidade dos profissionais da Enfermagem. Leia abaixo o artigo de Maria Goretti na íntegra:
“Sobre a matéria “Nova política de Atenção Básica ajuda meta de resolver 80% dos problemas de saúde nesta área da assistência”, assinada por Gustavo Frasão, da Agência Saúde, publicada em 31/08/17 no site do Ministério da Saúde, na condição de profissional de saúde, enfermeira e servidora pública passo a fazer os seguintes questionamentos às autoridades da área de saúde e, em especial, ao senhor Ministro Ricardo Barros:
Na nova Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) com os agentes comunitários passando a ter atribuições como “medir” pressão e fazer curativos, como será possível tornar a assistência mais resolutiva? Será que é isso mesmo que as pessoas precisam quando buscam os serviços de saúde? Quem capacitará os cerca de 200 mil agentes de saúde para essas atividades?
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É compreensível a aprovação da nova PNAB do Ministério da Saúde pelos gestores estaduais e municipais, devido possibilidade de ampliação do número de equipes e recebimento de novos recursos. Mas, tendo “esses profissionais”, que de fato não são, podendo “aferir pressão e glicemia, além de fazer curativos”, como ficam as linhas de cuidado, o exame físico, os diagnósticos, intervenções e orientações, a dispensação e entrega de medicamentos? Estes, sim, são procedimentos e ações que qualificam e tornam resolutivo o atendimento às pessoas e famílias no âmbito das unidades de saúde e dos domicílios.
Se de “um total de 329 mil agentes comunitários de saúde e de combate às endemias, 40% já possuem qualificação como técnicos em enfermagem”, por que não são admitidos como tal nos serviços de saúde? Vale lembrar que possuem essa qualificação, devido principalmente ao investimento público com o Profae – Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem do próprio Ministério da Saúde, desenvolvido no período de 2000 – 2006, que garantiu a qualificação de mais de 300 mil trabalhadores sem formação específica que atuavam nos serviços de saúde no Brasil.
Como acontecerá a capacitação dos “outros 200 mil” pelo Ministério da Saúde em um prazo máximo de cinco anos? Será que os gestores da saúde estão pensando, novamente, em atribuir essa responsabilidade aos Enfermeiros?
Também é possível compreender a necessidade das prefeituras em flexibilizar a composição de suas equipes de atenção básica para manutenção do recebimento de recursos federais. Mas, afirmar que a “nova legislação mantém o mínimo de profissionais – médico, técnico de enfermagem, odontólogo”, excluindo a Enfermeira e os Auxiliares de Enfermagem das equipes de Saúde da Família é inadmissível!
O Ministro Ricardo Barros deve ter conhecimento que o Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS, que evolui para Programa de Saúde da Família- PSF e depois Estratégia de Saúde da Família – ESF, independentemente, de equipe mínima ou não, sempre teve a Enfermeira como profissional nuclear, essencial e coordenador da equipe. Não é verdade?
Por que, então, não contratar mais Enfermeiras? Inclusive, para ampliar o conjunto de serviços essências que a enfermagem já presta à população. Sim, hoje, os profissionais de enfermagem atuam em serviços como pré-natal, parto e puerpério, na atenção à criança, à mulher, ao homem, ao idoso, no acompanhamento de hipertensos e diabéticos, nos procedimentos cirúrgicos de pequena complexidade, na aplicação de vacinas, no acolhimento ao cidadão nas unidades de saúde.
E, apesar de tudo isso, mesmo correspondendo a mais de 50% da força de trabalho no Sistema Único de Saúde, o trabalho e os trabalhadores da Enfermagem continuam invisíveis. E a última pergunta: quando os gestores da saúde entenderão que sem os profissionais de enfermagem é impossível organizar a atenção básica no País?”
* Maria Goretti David Lopes é enfermeira, ex-presidente da Associação Brasileira de Enfermagem-ABEn, e assessora executiva do Conselho Regional de Enfermagem do Paraná -Coren PR – Mensagens à autora devem ser enviadas para maria.lopes@corenpr.gov.br