O Supremo Tribunal Federal decidiu na terça-feira (20/02) que gestantes, puérperas ou mães com filhos de até 12 anos de idade sob sua responsabilidade terão suas prisões preventivas revogadas, substituídas pela prisão domiciliar. A Abrasco contribuiu como amicus curiae do processo e, no julgamento, foram apresentados dados da pesquisa “Nascer nas prisões”, coordenada pela abrasquiana e pesquisadora da Fiocruz Maria do Carmo Leal.
Em entrevista à BBC, Maria do Carmo declarou que quando uma mãe é presa “Ocorre uma desestruturação completa, porque a mãe em geral era o arrimo da família e ela desaparece repentinamente (da vida familiar)”. Leia trecho da reportagem da BBC Brasil, assinada pela jornalista Paula Adamo Idoeta:
O impacto da prisão repentina de uma mãe é “desvastador” para famílias carentes, explica à BBC Brasil Maria do Carmo Leal, médica e pesquisadora da Fiocruz e coordenadora de uma pesquisa chamada “Nascer nas Prisões”, cujos dados serão apresentados ao STF durante a votação desta terça.
Entre 2011 e 2014, a pesquisa da Fiocruz mapeou detentas gestantes ou mães de bebês pequenos em penitenciárias de 24 Estados brasileiros.
“A maioria tem entre 20 e 29 anos, é pretas ou parda, de baixa escolaridade e muita vulnerabilidade social. E 62% delas já tinham de dois a quatro filhos”, diz a médica.
“Mais da metade delas não tinha companheiros e um terço se declarou chefe de família. A maioria foi presa por delitos menores, como levar drogas para o marido na cadeia, vender pequenas quantidades da droga ou envolver-se em brigas. É a baixa democracia brasileira: prender mães pobres, (impondo-lhes) um castigo desse tamanho.”
A mulher não perde a guarda dos filhos ao ser presa, mas essa guarda fica suspensa até o julgamento definitivo do processo, suspensão que persiste se houver condenação a pena superior a dois anos.
“Os irmãos são separados para viver em abrigos ou serem cuidados por parentes ou vizinhos. E bebês de até seis meses ficam com as mães na prisão na maioria dos Estados, enquanto são amamentados. Mas é um período de grande sofrimento, porque a mãe não sabe o que vai acontecer com a criança em seguida. Daí, de um dia para o outro esse bebê simplesmente deixa de ver a mãe, algo inominável para o desenvolvimento e a saúde infantil”, prossegue Leal.
Os filhos das detentas são citados como parte interessada no habeas corpus porque o encarceramento de suas mães “viola massivamente direitos constitucionais das crianças, como saúde, alimentação (por conta da amamentação) e convivência com a família e a comunidade”, diz Pedro Hartung, advogado do Alana, grupo de defesa dos direitos infantis.
“Pesquisas mostram que crianças expostas a estresse, inclusive o afastamento da mãe e da família, levam essa marca para toda a vida em atraso cognitivo, problemas de saúde e estresse tóxico. É um impacto social muito grave. Todos nos beneficiamos como sociedade que as crianças tenham um desenvolvimento sadio. E para proteger essas crianças precisamos proteger suas mães.”
Mas o fato de essas mães serem potencialmente criminosas não configura um perigo a esses filhos? Para Hartung, os dispositivos legais já preveem que essas crianças sejam acompanhadas pelo Conselho Tutelar, que pode intervir caso o convívio com a mãe se converta em um risco. “Abusos ou violência podem resultar na perda do benefício da prisão domiciliar para a mãe”, diz ele.