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 NOTÍCIAS 

Promoção da saúde em territórios de favelas

Comunicação da Cooperação Social da Fiocruz*

As ausências do Estado, os conflitos armados e redes de poder, e a potência da sociedade civil organizada estiveram no centro do debate da Mesa Redonda ‘Estratégias para promoção da saúde e gestão territorial democráticas em favelas’ e ainda da Comunicação Oral ‘Território e participação’, mais especificamente na apresentação de André Lima no trabalho ‘Promoção da Saúde e Governança territorial democrática: desafios nas favelas de Manguinhos’, ambas aconteceram na tarde da sexta-feira, 27 e foram acompanhadas pela equipe de Comunicação da Cooperação Social da Fiocruz.

Profissional e pesquisador do campo da saúde devem compreender a complexidade política e sociocultural dos territórios onde se propõe a atuar. Para isso, sua ação deve passar pelo reconhecimento e pelo diálogo com os sujeitos coletivos atuando nas favelas. A emblemática fala de André Lima, morador de Manguinhos e doutor em História das Ciências pela Casa de Oswaldo Cruz com tese sobre participação social na saúde, foi o ponto de partida para a discussão da mesa redonda “Estratégias para promoção da saúde e gestão territorial democráticas em favelas”, ocorrida no Nust, nesta sexta-feira, 27, durante o 12º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva.

O debate foi mediado por Leonardo Bueno, pesquisador da Cooperação Social, com estudo na área dos impactos da violência armada na saúde dos moradores de favelas. Dela, participaram Alessandro Machado, do Museu da Vida, e antigo coordenador do Núcleo de Ações Territorializadas do museu da Casa de Oswaldo Cruz; Leonídio Madureira, coordenador de Cooperação Social da Fiocruz; além de André Lima, também trabalhador da Cooperação Social.

Territórios vulnerabilizados

Leonídio Madureira iniciou sua fala caracterizando o que chamou de “contexto de vulnerabilizade civil e socioambiental” identificado nas favelas. “O que vemos nessas localidades é um quadro estrutural de desigualdades sociais, previsto dentro da racionalidade do Capital, que afeta diretamente as condições de vida, o acesso à cultura, educação, saúde, e ambiente saudável nessas localidades”. A esse cenário, o servidor da Fiocruz, que há mais de 30 anos atua nas favelas de Manguinhos junto ao movimento social, acrescenta mais recentemente a violência armada e a disputa de poder entre grupos armados.

Nesse sentido, ele ressalta o papel da Fiocruz, como instituição estratégica de Estado em saúde, de cooperar com movimentos sociais e organizações populares, na perspectiva de ampliar suas capacidades de articulação, monitoramento, proposição de políticas públicas. “A atuação em territórios de favelas junto a grupos sociais historicamente minorizados delimita uma importante área de atuação, compreendendo que nós, em uma instituição vinculada ao Ministério da Saúde, temos um papel a cumprir com relação a eles, e que o protagonismo é deles. A Fiocruz e outras instituições de Estado devem saber qual é o seu lugar”, defendeu.

O núcleo de educação da Cooperação Social, em duas experiências recentes, formulou dois cursos com esse intuito. “Estratégias para territorialização de políticas públicas em favelas”, iniciado em junho deste ano, e composto por dois módulos, e o “Curso de atualização profissional: Gestão participativa em saúde” – ambos oferecidos em parceria com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Nos dois casos, o critério para ingresso era ser morador, trabalhador ou ter atuação em favelas e territórios periféricos da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
“São experiências que partem do reconhecimento da potência dos grupos populares quanto à formulação de saberes, e em que foi empregada – como princípio e prática – a Construção compartilhada do conhecimento e a condução participativa do processo formativo. Isso, chamando o movimento social inclusive para ocupar o espaço de docência e avaliação”, explicou André Lima, que compõem o núcleo.

Para além dos muros da instituição

A experiência de divulgação científica em favelas do Rio de Janeiro foi o mote da fala de Alessandro Machado, chefe do Museu da Vida da Fiocruz. Com o objetivo de levar ações de contextualização da promoção da saúde para territórios vulnerabilizados, o núcleo de Ações Territorializadas atua por meio de oficinas, exposições itinerantes, esquetes teatrais, levando e adaptando as discussões do campo da saúde pública para a realidade vivida dentro das comunidades.

Segundo Alessandro, o Complexo do Alemão e da Maré, a favela da Rocinha e bairros da Baixada fluminense, foram algumas localidades que receberam intervenções culturais. “Ao longo desses 18 anos, viemos construindo vários níveis de relação e participação com as populações desses territórios. A nossa metodologia de trabalho envolve sempre uma construção coletiva com a escola, ONG, coletivo cultural, enfim, com o parceiro que nos convidou. A partir daí, elaboramos o formato, tema, definimos público, e as características da ação”, explicou.

Alessandro lembrou que o ônibus Expresso da Ciência – que traz as escolas da região e quaisquer grupos organizados interessados em conhecer o Museu – também fez parte da estratégia de aproximar a população do espaço – que é público. Ele também citou como exemplo o “Projeto de inovação em educação e comunicação em zika e doenças correlatas”, que envolve Fiocruz Brasília, Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina, Laboratório de Educação Profissional em Vigilância em Saúde (Lavsa), e Museu da Vida, da Casa de Oswaldo Cruz.

“Foram formados por multiplicadores de ações de vigilância sanitária de base territorial, feitas ações de educação, popularização da ciência e de mobilização social envolvendo escola, comunidade, serviços e instituições de ciência e tecnologia”, disse, lembrando que o direito à saúde também envolve o acesso à educação e à cultura.

Fiocruz e Favelas de Manguinhos: uma relação histórica

A relação centenária da Fiocruz com o território de Manguinhos também foi tema da Comunicação Oral “Promoção da saúde e governança territorial democrática: desafios nas favelas de Manguinhos”, realizada por André Lima, no dia seguinte, sábado (28), no Pavilhão Arthur Neiva.

Fruto de suas pesquisas para o doutorado na Casa de Oswaldo Cruz, de sua experiência de 14 anos como morador de Manguinhos, e como bolsista do Programa de Promoção de Territórios Urbanos Saudáveis (Ptus), da Cooperação Social, André recapitulou algumas experiências da Fiocruz em interface com a comunidade.

Das iniciativas históricas consideradas modelares na experiência da Fiocruz em sua relação com Manguinhos, André destaca a Universidade Aberta, em 1993. O projeto visava aproximar a comunidade acadêmica à realidade da população, e associar os saberes para melhoria da qualidade de vida nesses territórios. O Programa de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (Dlis-Manguinhos) em 2000, e a formação da Cooperativa dos Trabalhadores de Manguinhos (Cootram), também foram lembrados.

Em 2010, o pesquisador rememora a criação do Território Escola Manguinhos (Teias-Manguinhos). “Até então a Fiocruz contava com o Centro de Saúde, mas a partir dali, passa a ter cobertura de 100% do território pelas equipes de Saúde da Família passando a incorporar uma responsabilidade com esse território até então não vista”, avaliou. Ele também referenciou a experiência do Laboratório Territorial de Manguinhos, da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz), como iniciativa que busca aderir à ideia de uma comunidade ampliada de produção de conhecimento.

Em vigência pela Cooperação Social, o Programa de Promoção de Territórios Urbanos Saudáveis foi apresentado em suas linhas gerais. De acordo com André, o programa possui como diretriz programática o fortalecimento de organizações de base sociocomunitárias em Manguinhos e outros territórios – sejam elas formalmente constituídas ou não. Para isso, são definidas as áreas de atuação:

– Enfrentamento às violências, que envolve a articulação com o Programa Institucional de Violências e Saúde e Programa Institucional Álcool, Crack e outras Drogas, da Fiocruz, e a formação de redes extra-territoriais, com Maré, Jacarezinho, Rocinha, e outras favelas do Rio de Janeiro;
– O eixo de Território, arte e saúde, que envolve o convênio com a Oscip Rede CCAP, há mais de 30 anos atuante em Manguinhos, e o apoio ao Ecomuseu de Manguinhos;
– O fortalecimento da Comunicação comunitária crítica, que se expressa no apoio à Agência de Comunicação Comunitária e ao jornal Fala Manguinhos!;
– Gestão ambiental participativa, com o apoio às ações do Observatório da Sub Bacia Hidrográfica do Canal do Cunha.

A comunicação oral foi coordenada pela pesquisadora Fátima Pivetta, coordenadora do Laboratório Territorial de Manguinhos (LTM/Ensp/Fiocruz).

*A Assessoria de Comunicação Cooperação Social da Fundação Oswaldo Cruz participou da Cobertura Colaborativa do Abrascão 2018 com as jornalistas Luiza Gomes e Roberta Nunes. Edição de Vilma Reis.

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